17/10/2006

Cenas do próximo capítulo

Cintilando pelo escuro o vaga-lume extingue a escuridão.

Uma simples fagulha queima toda a floresta.

A raiva consome a energia, enquanto o intocado descansa em mares calmos.

A visão limitada pelos sentidos capta apenas as necessidades mais egoístas, como se os olhos, mesmo voltados para fora, só pudessem enxergar o caminho que leva ao próprio umbigo.

Umbigo esse que um dia já esteve ligado à mãe, que esteve ligado a vó e a bisavó e assim infinitamente durante séculos e séculos.

Será difícil perceber que espaço e tempo se entrelaçam?

As vozes só podem expressar meias verdades, porque admitir a ignorância é embaraçoso.

Dessa forma seguimos por estradas imaginárias, sem começo ou fim, que não sabemos onde vão dar, impulsionados apenas por uma aparente necessidade de vir a se tornar algo melhor.

Será difícil perceber que o Universo em todo seu sutil e radiante equilíbrio não é capaz de gerar coisas incompletas?

O verdadeiro cordão umbilical não pode ser cortado, permanecemos todos unidos em um grande útero fértil de vida, nascendo e renascendo apenas em nossa ignorância, enquanto os fatos e acontecimentos se manifestam com novos enredos baseados em repetitivos padrões.

Será difícil perceber que a água que escorre pelos dedos e a mesma que corre pelas veias?

Dentro e fora são apenas referências simbólicas.

Em uma era de rebuliços bélicos formados em torno de questões materiais irrelevantes, não há mais tempo para desperdiçar com o que é passageiro, abra-se para o eterno.

Perceba que, independentemente de sua idade, toda sua vida serviu apenas de aperitivo para algum acontecimento maior projetado no futuro, mas que nunca é servido.

Temos o poder de vivenciar apenas um contínuo e ininterrupto momento, que cansamos de desperdiçar com pormenores, não espere até o último capítulo para obter suas conclusões, aproveite enquanto o tempo parece infinito para mergulhar na brevidade do agora!

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16/10/2006

A mãe de todos os seres

O homem em estado de ignorância acredita que a terra só é útil quando nua.
Como se a pele servisse melhor sua função quando esfolada em carne viva.

A terra decompõe e separa assim como nutre e alimenta.

É a tensão entre esses processos aparentamente opostos, que faz germinar a vida.

A Terra é o grande útero e seu amor tão profundo que gera um câncer com o mesmo carinho que gera uma criança.

Porém, com "T" maiúsculo ou "t" minúsculo, palavras diferentes que se referem a mesma coisa.

Compreenda isso e o planeta deixará sua rotação elíptica ao redor do Sol para se fixar sob seus pés, da onde nunca saiu.

O lenhador, o caçador, o extrativista, o empresário, o político, o fiscal, o ambientalista, o amante, o poeta.

O filho e o câncer.

Somos todos a própria vida de Gaya.

Faça sua escolha.

30/09/2006

Re: CongestionadaMente

Esse texto foi resposta a um amigo-mestre-irmão, que escreveu em seu blog um poema sobre a congestionada mente. _________________________________

Para escapar do trânsito é necessário atingir novos horizontes.

Horizontes muito além do que os olhos podem ver, mas tão próximos que as mãos podem tocar.

Estar a um passo de distância desse horizonte é estar a infinitos quilometros de distância.

Caminhar sem pernas é a forma de encontrá-lo.

Para que desperdiçar horas em ruas apertadas, buscando a felicidade em alguma esquina?

Porque todos estão sempre indo para algum lugar, significa que ninguém a encontrou.

Descongestionando-se do samsara.
Congestionando-se na mudança.

Bem-vindo a terra do nunca...

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27/09/2006

O verdadeiro nome

E foi assim que aquele sorriso mudou completamente minha vida.
Tanto que as lágrimas secaram.

Tanto que o Sol voltou a nascer.

Não há mal que não se renda a um coração aberto.

Dizem que quando a morte sorri, a única coisa a ser feita é sorrir de volta.

Pois naquele sorriso eu morri.

Os olhos enrrugados, as costas cansadas e a sabedoria de quem na vida experimentou o sucesso e o fracasso, o êxtase e a dor e que aprendeu que nada se leva desse mundo.

Para tudo eu estava preparado, para tudo eu tinha defesa, menos para a inocência daquele olhar.

Aquele olhar me fez perceber o quanto eu suportava apenas para receber a aparente aprovação dos outros.

Aquele olhar me fez perceber o quanto eu suportava apenas para receber a aparente aprovação de mim mesmo.

Bom menino eles diziam...

Homem de sucesso eles diziam...

Renascido no novo e novamente de peito aberto, deixo para trás o passado sem olhar de volta.

Por favor a partir de hoje me chame pelo meu verdadeiro nome.

Aquele que quando a boca clama também escuta.

Aquele que todo corpo vê através dos olhos.

Sorria, você está sendo chamado.


"Tão curto e tão intenso...
...tão intenso que em sua totalidade era eterno."

26/09/2006

Num breve instante da eternidade

Tenho buscado por algo, que parece ter se perdido há muito tempo atrás.
Não me recordo do som, da cor ou do sabor, não sei sua forma, nem conheço seu tamanho.

A única coisa que prova a sua existência é a minha contínua busca.

Os prazeres não me contiveram, nos beijos não achei alívio, no dinheiro não encontrei conforto.

Tudo que tenho são visões e lapsos de memória.

Uma molécula de hidrogênio vagando no espaço recém criado.
Uma célula em um caldo de vida nas crateras da jovem Terra.
Um peixe deixando a água para virar réptil.
Um réptil deixando a terra para virar peixe.
Um chimpanzé colhendo frutas nas remotas florestas equatorianas.
Um homem das cavernas aprendendo a se equilibrar sobre duas patas.
Um servo a puxar pesadas pedras pelo deserto.
Um homem pendurado pelas mãos a uma cruz de madeira.
Um pirata pilhando os velhos galeões no mar do caribe.
Um obeso Sr. Feudal anexando terras a seus domínios.
Um samurai servindo honrosamente ao seu senhor.
Um astronauta deixando a primeira pegada na Lua.

Títulos e nomes mudam, mas permaneço o mesmo homem, atrelado a mesma mente, continuamente seguindo os mesmos antigos padrões, que se repetem egoístas dia a dia.

Como se meu sofrimento fosse o maior do mundo.
Como se minhas lágrimas fossem as mais doloridas.
Como se meu conhecimento abrangesse a tudo.
Como se minha ignorância fosse a mais humilde.

Diferentes épocas, as mesmas guerras.

Exércitos de pensamentos que disputam minha cabeça, cada qual com seu líder, estratégia e objetivo.

No frio da noite cedo a pressão novamente.

Faço o que não deveria de fazer.

Me entrego a quem jurei distância.

Se digo que sou covarde, sempre fui.
Se digo que devo ser forte, sempre sou.
Mas como sempre as palavras não bastam.

Embebedado pela inconsciência mergulho novamente nos ciclos repetitivos do comportamento, apenas para colher os mesmos amargos frutos novamente. Como é duro aprender.

Pela manhã o que consegui se esvai com o vento, os tesouros que acumulei dissolvem-se como sal no mar. Minhas ações não são nada mais do que belas palavras em uma placa de mármore, que com os anos o limo vem a tomar.

Os potentes telescópios modernos trazem imagens de bilhões de anos atrás, formações estrelares com elipses irregulares e padrões rotacionais diferentes dos atuais. O Universo estava aprendendo a formar galáxias.

Se ele pode, porque eu não posso? Será que ele também não errou?

As forças da física são tão precisas e suas fórmulas matemáticas tão lógicas que é difícil acreditar que realmente existam. Quem controla algo tão perfeito?

Que linha invisível é essa que conecta a molécula de hidrogênio ao pirata do mar?

Se tudo está em permanente movimento, o que mantém as coisas unidas?

O princípio gerador das galáxias é o mesmo que mantém meu coração batendo?

Talvez a resposta última para minha busca esteja nas respostas dessas perguntas. Mas quem as responde? E quem as pergunta?

Molécula de hidrogênio entrando, molécula de hidrogênio saindo.

Juntamente com outros gases a respiração continua independente de minha vontade.

Por mais que procure em mim algo que seja “eu”, não sou capaz de encontrar.

Células nascendo, células morrendo, comida entrando, fezes saindo e a permanente transformação me carrega também.

O chimpanzé do Congo pisa na Lua agora na forma de um astronauta no passar de um instante.

Ainda assim o que permanece?

Fecho os olhos, abandono as questões, abandono as respostas, abandono quem pergunta e abandono quem responde. Abandono o abandonar para ser apenas o que tudo apenas é.

Aquelas velhas galáxias girando não são nada mais do que Eu.
O peixe buscando na terra vida nova sou Eu.
O servo carregando as pesadas pedras sou Eu.

Sou o servo, a pedra, o deserto e a pirâmide.

É muito óbvio, por isso é tão raro que alguém encontre a verdade além das palavras e poemas.

Os pássaros cantando, a Lua sorrindo, as estrelas brilhando, o mar quebrando, vida nascendo, vida morrendo, evolução evoluindo, sangue circulando, trigo crescendo, floresta queimando.

Relembro quando imaginava estar separado de tudo isso, que absurdo! Separado do que? A vida após a morte é aqui mesmo. Se você não puder encontrar a tranqüilidade agora, não encontrará nem no Paraíso.

Afinal, aonde você pensa que está ?!

22/09/2006

Bambu cheio, Bambu oco

Esta é a história de um bambu, que perturbado com as incertezas da vida, decidiu abandonar sua família na floresta para ir em busca de sua verdadeira natureza oca.
Viajou por muitas cidades e países e apesar de encontrar alguns mestres e ensinamentos, sua insatisfação o conduzia sempre adiante.

Em uma dessas viagens finalmente encontrou um templo na China, onde pela primeira vez teve um vislumbre do que poderia ser a resposta aos seus questionamentos.

Mergulhou na meditação, permanecendo sentado silenciosamente durante horas na mesma postura, apenas observando o ar entrando e saindo e o ritmo natural das coisas.

Depois de alguns meses já havia se habituado a vida monástica, foi quando, durante uma prática, sentiu que todo seu ser abria-se, acompanhado da sensação de uma profunda tranqüilidade. Percebeu que aquilo que estivera buscando estava o tempo todo dentro de si mesmo e que esta substância que o forma é a mesma substância que circunda tudo ao seu redor.

Reverenciou a existência e partiu tendo encerrado a busca que o trouxera até ali. Retornou a floresta onde cresceu e passou a guiar sua vida a partir desta experiência.

No entanto o bambu não era capaz de encontrar a felicidade em sua rotina diária e tudo parecia se organizar de forma a atrapalhar seu caminho. Olhava ao redor e a cada dia ficava cada mais entristecido com as atitudes e comportamentos de seus semelhantes.

O mundo estava enlouquecido e só podia pensar que aquilo não passava de uma experiência que deu errado.

Acontece que por uma dessas razões desconhecidas da vida, acabou cruzando com um cipreste, que morava naquela região a muitos e muitos séculos.

A velha árvore era enorme, sua copa tocava o céu e suas raízes fincavam-se na terra. Apesar de seu tronco ser grosso, tinha uma flexibilidade incomum, que o fazia dançar com o vento.

O bambu caminhava silenciosamente para não perturba-lo, quando ouviu uma voz:

- Ouvi dizer que você é o bambu que compreendeu a própria natureza oca. É verdade? – Indagou o cipreste.

- Sim. Respondeu o bambu.

- Ora, mas isso é fácil! Gostaria de saber se você é capaz de perceber que eu também sou tão oco quanto você! – Replicou a velha árvore.

- Não sei como isso é possível. Sua essência é sólida e seu interior maciço, não há nem mesmo um único centímetro oco em todo seu ser.

- É porque seu conceito de oco ainda é muito raso. O que o faz verdadeiramente oco é a ausência de um eu particular, separado do restante.

O bambu permaneceu em silêncio e o cipreste continuou:

- Observe sua mente. Não aniquile seus pensamentos, nem force a si mesmo permanecer em um silêncio mórbido, agindo dessa forma você cessa as ilusões, mas também cessa a possibilidade da verdade se manifestar.

O mundo é vazio como o céu, mas no céu estão as nuvens, o Sol, a Lua, as estrelas, se você puder clarificar isto estará livre de todo o sofrimento.

Em profunda contemplação o bambu deixou então que os pensamentos fluíssem naturalmente por sua mente, afinal eles também são uma manifestação da verdade. Não se apegando a um ou outro em particular, pôde relaxar nesta atitude, até que de repente, em uma fração de segundo, voltou toda sua atenção para aquele que observava.

Percebeu que não havia nada onde os pensamentos, as emoções, o corpo ou o ego pudessem se apoiar e com isso compreendeu a verdadeira natureza das coisas.

- Sim, esse é o oco que abriga todos os seres. Confirmou o cipreste.

- Agora olhe ao seu redor – continuou.

E o bambu voltou seus olhos para fora e contemplou que toda a floresta não deixou de estar nem por um único segundo ausente desse contato, apesar de que alguns ainda não eram capazes de realizá-lo. Percebeu também que não poderia se orgulhar daquilo que se tornou, pois aquilo nada mais é do que o que ele sempre foi, apesar de ter esquecido.

Anos mais tarde o mesmo bambu foi encontrado por um músico ancião que o esculpiu em uma flauta. Diz a lenda que de suas canções brotaram os Vedas, o Tao Te King, a Bíblia e todos os textos religiosos conhecidos atualmente.

Mais isso é apenas uma história...

Assim como é

Quando a noite os olhos se fecham,
nunca mais voltam a abrir.

Outros olhos, outras manhãs.

Os que saem pela porta não voltam mais,
os que ficam também não.

As oportunidades surgem, as adiamos e elas se vão.
As oportunidades surgem, as aceitamos e elas não são o que imaginávamos.

Insatisfeito com o velho, confuso com o atual, com medo do novo,
o tempo continua correndo sem pedir licença.

Não há fundação que o suporte.
Não há edificação que não se abale.

No mundo dos espíritos a matéria não pode ser agarrada.
No mundo dos vivos também não.

Mas existe o verdadeiro lar: sem teto, sem porta e sem chão,
que independente de nossos desejos e anseios, apenas é.

Articulando pela união as partes se separam.
Penso no todo que me cabe e deixo de lado o todo que cabe aos outros,
como se o todo estivesse suscetível as divisões.

Um dragão indomado ataca os mocinhos e os vilões.
Uma criança sem cuidados se perde na multidão.

Uma árvore de centenas de anos,
cai com uma fagulha instantânea do céu.

O amor é eterno, o amado não.
O amor é eterno, a amada não.

Soprando como uma brisa afasta e aproxima as folhas na copa.
Se lembrassem que pertencem à mesma árvore não teriam tantos receios.

Através da posse surgem às perdas e os ganhos,
mas no amor não existe investimento e retorno.

Os sonhos terminam, as ligações não.
Próximos ou distantes estamos todos interligados.

Em uma fração de segundo quem era especial torna-se chato.
Em uma fração de segundo quem era chato torna-se especial.

Alternando minha maneira de ver as coisas,
vou criando o bom e o ruim conforme a situação.

Em busca de um pouco de alívio fujo de mim mesmo.

Momentaneamente esquecido e apenas deixando acontecer,
acredito que as coisas se resolverão por si mesmas.
Mas não se resolvem.

O coração não se parte apenas se fecha.
O verdadeiro cordão umbilical jamais foi cortado.

Entregue à correnteza a água flui naturalmente pela planície.

Os recém-nascidos choram.
As baratas são imunes à radioatividade.
As prostitutas não beijam na boca.

Não culpe as coisas por elas serem o que são.
Não culpe a existência por não se adaptar ao que você julga correto.

Definindo o certo e o errado julgo mal aquilo que pouco conheço.
E ainda assim acredito e defendo fielmente minha posição.

O apego pela fortuna alimenta a ganância.
O apego pela bondade também.
O apego pela fortuna escurece a visão.
O apego pela bondade também.

A mente intranqüila e insatisfeita busca a felicidade onde ela não está.
A ganância se manifesta por pouco e por muito.
Inescrupulosa e egoísta, destruindo sonhos e memórias.

Apenas,

Deixe de lado suas dúvidas e celebre.
Deixe de lado suas mágoas e celebre.
Deixe de lado seus problemas e celebre.

Abandone suas disputas e rancores.
Abandone suas ilusões e preconceitos.
Abandone suas idéias pré-concebidas.

As flores desabrocham.
A cada instante, a cada instante, a cada instante.

As flores murcham.
A cada instante, a cada instante, a cada instante.

Todos somos a própria vida do Universo,
compartilhando das mesmas causas e condições.

Neste breve momento chamado de presente,
todo o passado e todo o futuro se manifestam.

Não se esqueça,
você é muito especial!