26/09/2006

Num breve instante da eternidade

Tenho buscado por algo, que parece ter se perdido há muito tempo atrás.
Não me recordo do som, da cor ou do sabor, não sei sua forma, nem conheço seu tamanho.

A única coisa que prova a sua existência é a minha contínua busca.

Os prazeres não me contiveram, nos beijos não achei alívio, no dinheiro não encontrei conforto.

Tudo que tenho são visões e lapsos de memória.

Uma molécula de hidrogênio vagando no espaço recém criado.
Uma célula em um caldo de vida nas crateras da jovem Terra.
Um peixe deixando a água para virar réptil.
Um réptil deixando a terra para virar peixe.
Um chimpanzé colhendo frutas nas remotas florestas equatorianas.
Um homem das cavernas aprendendo a se equilibrar sobre duas patas.
Um servo a puxar pesadas pedras pelo deserto.
Um homem pendurado pelas mãos a uma cruz de madeira.
Um pirata pilhando os velhos galeões no mar do caribe.
Um obeso Sr. Feudal anexando terras a seus domínios.
Um samurai servindo honrosamente ao seu senhor.
Um astronauta deixando a primeira pegada na Lua.

Títulos e nomes mudam, mas permaneço o mesmo homem, atrelado a mesma mente, continuamente seguindo os mesmos antigos padrões, que se repetem egoístas dia a dia.

Como se meu sofrimento fosse o maior do mundo.
Como se minhas lágrimas fossem as mais doloridas.
Como se meu conhecimento abrangesse a tudo.
Como se minha ignorância fosse a mais humilde.

Diferentes épocas, as mesmas guerras.

Exércitos de pensamentos que disputam minha cabeça, cada qual com seu líder, estratégia e objetivo.

No frio da noite cedo a pressão novamente.

Faço o que não deveria de fazer.

Me entrego a quem jurei distância.

Se digo que sou covarde, sempre fui.
Se digo que devo ser forte, sempre sou.
Mas como sempre as palavras não bastam.

Embebedado pela inconsciência mergulho novamente nos ciclos repetitivos do comportamento, apenas para colher os mesmos amargos frutos novamente. Como é duro aprender.

Pela manhã o que consegui se esvai com o vento, os tesouros que acumulei dissolvem-se como sal no mar. Minhas ações não são nada mais do que belas palavras em uma placa de mármore, que com os anos o limo vem a tomar.

Os potentes telescópios modernos trazem imagens de bilhões de anos atrás, formações estrelares com elipses irregulares e padrões rotacionais diferentes dos atuais. O Universo estava aprendendo a formar galáxias.

Se ele pode, porque eu não posso? Será que ele também não errou?

As forças da física são tão precisas e suas fórmulas matemáticas tão lógicas que é difícil acreditar que realmente existam. Quem controla algo tão perfeito?

Que linha invisível é essa que conecta a molécula de hidrogênio ao pirata do mar?

Se tudo está em permanente movimento, o que mantém as coisas unidas?

O princípio gerador das galáxias é o mesmo que mantém meu coração batendo?

Talvez a resposta última para minha busca esteja nas respostas dessas perguntas. Mas quem as responde? E quem as pergunta?

Molécula de hidrogênio entrando, molécula de hidrogênio saindo.

Juntamente com outros gases a respiração continua independente de minha vontade.

Por mais que procure em mim algo que seja “eu”, não sou capaz de encontrar.

Células nascendo, células morrendo, comida entrando, fezes saindo e a permanente transformação me carrega também.

O chimpanzé do Congo pisa na Lua agora na forma de um astronauta no passar de um instante.

Ainda assim o que permanece?

Fecho os olhos, abandono as questões, abandono as respostas, abandono quem pergunta e abandono quem responde. Abandono o abandonar para ser apenas o que tudo apenas é.

Aquelas velhas galáxias girando não são nada mais do que Eu.
O peixe buscando na terra vida nova sou Eu.
O servo carregando as pesadas pedras sou Eu.

Sou o servo, a pedra, o deserto e a pirâmide.

É muito óbvio, por isso é tão raro que alguém encontre a verdade além das palavras e poemas.

Os pássaros cantando, a Lua sorrindo, as estrelas brilhando, o mar quebrando, vida nascendo, vida morrendo, evolução evoluindo, sangue circulando, trigo crescendo, floresta queimando.

Relembro quando imaginava estar separado de tudo isso, que absurdo! Separado do que? A vida após a morte é aqui mesmo. Se você não puder encontrar a tranqüilidade agora, não encontrará nem no Paraíso.

Afinal, aonde você pensa que está ?!

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